Estes três jornais de referência partilhavam uma prática comum nos Estados Unidos, de apoiarem institucionalmente um dos candidatos presidenciais, mantendo a neutralidade nas suas peças noticiosas, mas assumindo a preferência por um dos partidos, em cada eleição presidencial.

Contudo, nas últimas semanas, foram sucessivamente anunciando que, nas eleições presidenciais de 2024 abdicavam da escolha de um qualquer candidato e, no caso do The New York Times, esclarecendo que manterão esta prática no futuro.

O momento destas decisões, a poucas semanas das eleições, marcadas para 05 de Novembro, foi de imediato aproveitado como um sinal de que estes jornais - que predominantemente escolheram candidatos do Partido Democrata, nas últimas décadas - se estavam a distanciar da vice-Presidente e candidata democrata, Kamala Harris.

A direcção de campanha de Donald Trump lembrou que "mesmo os conterrâneos de Kamala Harris na Califórnia sabem que ela não tem competência para o cargo", referindo-se à decisão do Los Angeles Times de não apoiar a vice-Presidente, apesar de esta ter sido procuradora-geral naquele estado da costa oeste.

Quem não gostou da decisão imposta pelos proprietários do jornal de Los Angeles foi a sua directora editorial, Mariel Garza, que apresentou a sua demissão, na passada semana, depois de conhecer os argumentos dos administradores.

"Demito-me porque quero deixar claro que não ficaria bem se nada dissesse", explicou Garza, em declarações à revista académica Columbia Journalism Review, acrescentando que tinha sido informada de que o jornal se preparava para apoiar Harris - mantendo a tradição de há décadas de apoiar candidatos democratas - tendo recuado pouco depois.

Para a antiga directora da revista Time, Nancy Gibbs, as decisões destes jornais de referência - e, sobretudo, o seu 'timing' - são uma "auto-sabotagem" que prejudica a imagem das publicações e também adensa suspeitas sobre a independência do jornalismo.

"Anunciar uma alteração de políticas tão perto das eleições sugere cobardia mais do que convicção", defendeu Gibbs, num artigo de opinião publicado este fim de semana no The New York Times.

Gibbs recorda que estes jornais de referência são propriedade de milionários - Patrick Soon-Shiong é o dono do jornal de Nova Iorque e Jeff Bezos, fundador da Amazon, é o dono do The Washington Post -, pelo que a decisão de abandonar a prática de apoiar candidatos (tradicionalmente democratas, nestes casos) pode dar a entender que estas figuras podem querer agradar ao republicano Donald Trump, acusado por muitos de querer beneficiar as grandes fortunas.

Também o ex-director do The Washington Post, Marty Baron, usou a sua conta na rede social X para criticar a decisão do seu antigo jornal, acusando a decisão de neutralidade de ser "uma cobardia que coloca a democracia em risco".

Para Baron, esta decisão pode até ser uma oportunidade para "Donald Trump ver isso como um convite a intimidar o proprietário, Jeff Bezos", lamentando que se tenha chegado a este ponto num jornal que tinha "cultivado a imagem de independência e coragem".

A cadeia noticiosa pública NPR noticiou na segunda-feira, citando duas fontes anónimas do The Washington Post, que mais de 200.000 pessoas cancelaram as suas assinaturas na sequência do anúncio de não apoio de qualquer candidatura presidencial, informação não comentada pela porta-voz do jornal, Olivia Petersen.

O The Washington Post tinha mais de 2,5 milhões de assinantes no ano passado, a maioria deles digitais, sendo o terceiro mais lido do país, atrás do The New York Times e do The Wall Street Journal.